Hoje cedo eu levantei da cama as oito em ponto, sai e voltei para baixo do edredom umas quinze vezes, olhei meu celular e ri com alguma mensagem boba, depois acordei. Tremi quando meu pé tocou o chão ainda frio do quarto, abri a porta e meu gato entrou correndo e subiu na cama. Lancei-lhe um olhar de censura, mas ele nem deu importância. 

Hoje cedo o espelho disse que meu cabelo não teria jeito, que tinha uma espinha bem grande no meu nariz e que eu parecia um panda com sono. Só pra me vingar, fiz uma cara bem feia pra ele. Tomei banho cantando e depois vesti a primeira roupa que encontrei, como sempre. Meu gato continuava aninhado na cama, o chão estava menos frio,(ou era eu que estava menos quente?), abri a janela num ímpeto e o sol entrou no quarto. Meu gato pareceu odiar a súbita luminosidade e tratou de dar o fora rapidinho. Lancei-lhe um olhar de vingança, mas ele nunca se importa. 

Hoje cedo os jornais tinham novas noticias ruins, a televisão ainda tentava manipular as pessoas com programas de culinária e gente fútil, eu saí na rua e o sol se tornou agressivo e irritante. As pessoas ainda não tinham paciência e tocavam suas buzinas na intensidade de suas dores, torcendo pra alguém decifrar as emoções contidas naquelas pequenas onomatopeias estridentes. 

Hoje cedo os ipês tinham derramado uma chuva de flores rosas e amarelas que cobriam o chão, mas pouca gente percebia. Eu tomei cuidado pra não pisar em nenhuma e senti vontade de deitar entre elas. Coloquei meu fone e a voz do Chico Buarque acalentou meus ouvidos e remexeu meus sentimentos. Atravessei a faixa de pedestres quase dançando aquele sambinha gostoso, não reclamei quando o vento bagunçou meu pouco cabelo, cantei todas as musicas que tocavam pelo caminho no meu celular. 

Hoje cedo eu quase tomei banho em um chafariz da praça, mas tinha gente vigiando e talvez eu fosse presa. Hoje cedo eu dei bom dia pra moça que limpa as folhas na rua, perguntei como estava o senhor que me vende o jornal e fiz uma piada com a menina da padaria onde tomo café.

Ontem a noite , antes de dormir, eu rezei e pedi paz e serenidade. Pedi equilíbrio e sentimentos bons, pedi que o mundo fosse um lugar melhor pra mim e pra todos. Hoje cedo, eu entendi. Que esse mundo melhor começa dentro de mim. A cada sorriso que eu dou, a cada bom dia, a cada vez que faço alguém sorrir, a cada vez que sinto alegria nas coisas mais simples. Equilíbrio é encontrar motivos pra ser feliz a cada dia que renasce. E renascer junto. Acreditar nos sonhos, no amor e nas pessoas. 

Hoje cedo, amanha cedo, todos os dias. Nunca é tarde demais.